quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

um cigarro e três vidas


gerson é gerente de banco na oswaldo aranha. saiu de seu trabalho às 9:45. tarde assim porque tinha que fechar o balanço do mês. seguiu em direção à ramiro barcelos, caminhando. já era tarde, mas o calor infernal do dia ainda era sentido na calçada. enquanto andava, gerson percebeu um cigarro caindo de apartamento do prédio de 17 andares ao seu lado. o cigarro tinha marca de batom. cairá ao solo às 9:52. gerson imaginou uma morena de trinta anos fumando nua na cama, enquanto o homem com quem tinha recém feito sexo já dormia. a morena acendeu um cigarro pra pensar na vida. acabou, jogou pela janela e foi dormir. gerson não entendia como o cigarro fazia pessoas pensarem tanto.
taiane saia da aula de cursinho preparatório para concurso público. dedicava 13 horas de seu dia para, quem sabe, fazer parte da burocracia estatal. andava pela oswaldo aranha em direção à felipe camarão. às 9:52, passava por um prédio alto. viu um cigarro cair lentamente na calçada. tinha uma marca de batom vermelho. olha ao redor, um homem semi-gordo de aspecto triste também percebe. certamente, se tratava de uma festa em que uma convidada havia jogado seu cigarro pela janela. não gostava de fumantes, eram mal educados.
às 11:34, do mesmo dia, gerson está sentado na privada da sua casa, com o chuveiro ligado ao lado. soca uma punheta pensando na cena do cigarro. fazia tudo escondido da sua esposa, que assistia televisão na sala ao lado. curiosamente, gerson focou mais atenção na largura das costas do homem que dormia ao lado da morena.
às 10:41, após comer uma miojo, taiane toma dois comprimidos de antidepressivos, um remédio para manter a atenção e se preparar para mais uma madrugada de estudos. com um sorriso, imagina sua carreira brilhante como funcionária pública e o apartamento que iria comprar (morava em um jk alugado). daria festas? não, esse pessoal costuma estragar os móveis.
às 9:51, carla fecha o romance que relia. toma o último gole de vinho tinto. estava sozinha, por opção. gostava de noites em que se despia de suas máscaras sociais e se reencontrava com o seu espírito. mais cedo, tinha organizado sua casa, para se reencontrar na bagunça. havia até experimentado batons antigos, pra ver o que prestava. agora, iria assistir filmes até cair no sono. dá uma última pitada em seu cigarro, companheiro de solidão, e o joga pela janela.
às 9:52, na oswaldo aranha, três carlas existiram ao mesmo tempo. a verdadeira, a que gerson sonhava e aquela que taiane queria ser, mas negava. 

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